terça-feira, 5 de junho de 2012

Cultura digital

Autora: Gioconda Belli (Tradução: Silvio Diogo)

Cada dia escuto ou leio mais opiniões sobre os prós e contras deste mundo no qual muitos de nós mergulhamos de cabeça: o mundo do Facebook, do Twitter, dos comentários digitais. Há preocupação entre os pais em relação à quantidade de horas que estão passando os filhos conectados a seus aparelhos; há preocupação no trabalho pela constante distração dos empregados que passam o dia checando seu celular ou sua página do Facebook; há preocupação até entre os casais que veem seu tempo em comum compartilhado cada vez mais com o computador.

Entre as análises e os estudos que li, um no New York Times comentava sobre a queda na produtividade dos estudantes cujos pais não põem limites ao uso que fazem da tecnologia. Dizia o estudo que inicialmente se pensou que dar acesso generalizado aos jovens à Internet redundaria em benefício para eles, uma vez que é um instrumento eficiente para pesquisar e aprender. Entretanto, o que descubriram e não calcularam é que o tempo dos jovens na Internet está dedicado quase 100% ao entretenimento. Aparentemente são muito poucos os jovens que estão aproveitando as imensas possibilidades educativas do meio. O entretenimento que encontram na rede – Facebook, jogos, música etc. – transformou-se no vício moderno dos jovens. E digo vício porque outro estudo analisou o efeito no cérebro do modo de comunicação digital. Aparentemente, a rapidez da comunicação, o intercâmbio de comentários, o “curtir” e todo o mecanismo com que operam as redes sociais, por exemplo, causam na mente um efeito similiar ao estímulo registrado nas pessoas que se viciam com os jogos de azar nos cassinos. Quem já sentiu que não pode desgrudar do computador e que passa horas no Facebook perdendo o tempo hipnotizado pela tela terá talvez se perguntado qual é a razão de seu comportamento. Pois bem, trata-se uma compulsão causada pela reação química do cérebro a um estímulo exterior imediato. Se os adultos sentimo-nos atraídos por esse estímulo, os jovens começam a necessitar dele como uma droga, de tal maneira que outras atividades, como a leitura, por exemplo, já não lhes parece igualmente satisfatória ou prazerosa.

Outro aspecto interessante do influxo e sedução da comunicação digital é a tendência cada vez maior ao isolamento, ao predomínio da comunicação pela máquina em detrimento do contato pessoal. Antes era necessário sair de casa para encontrar com os outros; agora não é necessário movimentar-se porque é possível estar em contato a partir do teclado. Além disso, é um contato CONTROLADO, em que se tem a faca e o queijo na mão, como se diz, e pode-se revelar ou não aspectos da personalidade que, num contato cara a cara, tendem a aflorar espontaneamente.

Até mesmo na vida política, ainda que a Internet e as redes sociais exerçam um papel extraordinário como instrumentos de convocatória em revoluções como a árabe, a da Ucrânia e as ações de ocupação nos Estados Unidos, salta à vista que a efervescência não esteja sustentada por um nível de organização de base que permita dar continuidade ou objetivos de longo prazo às ações empreendidas. O instrumento funciona, mas ainda carece de capacidade para transformar os triunfos da mobilização em propostas políticas. Alcança-se o imediato, mas quem colhe os ganhos são os poderes que de fato contam com a capacidade de colocar-se adiante depois da euforia. Isto pode dever-se, precisamente, ao tipo de mentalidade que gera a comunicação digital: propõe-se à satisfação imediata e não se dispõe ao empenho de planejar ou analisar a complexidade do que acontecerá depois, porque, para isso, se requer um nível de compromisso e de trabalho que as redes sociais não estão prontas para satisfazer.

É importante meditar sobre esse tema porque, se é óbvio o potencial que existe na comunicação digital, também são óbvios seus perigos: uma cultura de isolamento em que predominam a facilidade e a superficialidade; uma cultura que descarta a reflexão e o estudo necessários para crescermos intelectualmente e sermos mais efetivos como cidadãos e como pessoas.

Qual é a sua relação com a tecnologia? Poderíamos aplicar a estes tempos o ditado: “dize-me com quem andas que te direi quem és”? A discussão está aberta.

Publicado originalmente em 04 de junho de 2012 em Confidencial.com.ni

 

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